“Sangue pros deuses custa menos que rezar”.
Por Henry Garrit
Logo depois de seu debut nas páginas do Monstro do Pântano de Alan Moore, coube ao escritor inglês Jamie Delano juntamente com o artista John Ridgway (famoso por desenhar, entre outros títulos, Juiz Dreed) darem novas vida e voz ao enigmático John Constantine em uma série solo dentro do selo adulto da Vertigo.
Mal sabiam eles que estavam cultivando a semente do que se tornaria o título mais longevo e benquisto pelos leitores do selo. Hellblazer manteve o clima sombrio iniciado por Moore, colocando Constantine e os leitores em uma viagem frenética através do oculto. Esse volume encadernado resgata essas primeiras histórias, onde os leitores se deparam com personagens importantes na mitologia do mago, que o acompanhariam pelos anos vindouros como seu amigo Chas, a sobrinha Gemma, Papa Meia Noite e a paranormal Zed, que seria peça fundamental no seriado televisivo do ocultista. Por falar nisso, é interessante notar como a série realmente bebeu da fonte dessas primeiras histórias; embora o mérito da adaptação não seja o objeto desse texto, vemos que vários plots foram aproveitados, principalmente das histórias “Fome”, onde John tenta ajudar seu amigo Gary Lester contra um demônio, (a primeira história de Hellblazer) e “À espera do Homem”, onde John precisa salvar a vida de um grupo de meninas de um assassino ocultista (foi adaptado para o último episódio da 1º temporada da série).
As seis primeiras HQs de Hellblazer aqui reunidas neste encadernado revelam a profundidade de Constantine e abrem caminho para as grandiosas histórias que viriam, como a trama do evento ocorrido em Newcastle que de certa forma definiria o caráter e as motivações do mago. É interessante perceber como a caracterização do personagem, principalmente no tocante a sua personalidade mudou pouco no decorrer dos anos, o que talvez tenha sido um dos segredos do sucesso do título. Existe um encantamento presente em todas as páginas e é difícil não se envolver.
O texto de Delano é fluído e detalhado. Essa pode ser uma afirmação um tanto contraditória, mas assim como Alan Moore, embora carregue as páginas com muito texto, não desperdiça nenhuma vírgula da narração, montando um complexo vitral de palavras que se ligam e formam uma história instigante e aterradora. Ele usa muito do contexto histórico da época, utilizando diversas referências políticas e sociais, mesclando as deficiências humanas com tramas diabólicas, onde o melhor exemplo é quando o vemos fazendo um paralelo entre negociações da bolsa de valores com compra e venda de almas para o inferno numa analogia genial, que nos dá muito sobre o que refletir sobre o valor da vida e sua curtíssima duração; e sobre o tempo que desperdiçamos com questões mesquinhas em vez de aproveitar as coisas boas e simples que nos cercam.
Constantine é o tipo de personagem que nos ganha com seu carisma, o qual contrasta com sua maneira calhorda de ser. Talvez porque ele lide com tipos que conseguem ser ainda piores do que ele. Ou talvez porque no fundo, todos tenhamos um tanto dessa maneira calhorda em nós.
A arte de John Ridgway é suja e despojada, e aponto essas características como positivas; retrata com exatidão a realidade urbana de John, enraizada de magia negra e trapaças, tornando o texto de Delano mais forte ao ser a sua difícil tradução, um estilo narrativo no qual ele é especialista. Basta ler sua obra Hell Eternal (resenha AQUI) para saber do que estou falando.
Ao final da edição temos como complemento páginas de um jornal local britânico onde o repórter narra sua tentativa de entrevistar John Constantine, conforme descrito por ele, o ocultista que na sua juventude foi vocalista da banda de Punk Rock Membrana Mucosa, cuja a letra de um de seus sucessos você confere logo abaixo.
É espirituoso e sinistro.
É Hellblazer.
VÊNUS DO VAREJO (Tradução livre em português).
Amor aventura morte e glória
O breve adeus o sussurro da história
Uma ultima visão da dança do camaleão
E nas trevas adentrando o parque atravessando
Eu não sou o alvo da vênus do varejo
(todos juntos)
Eu não sou a vênus do varejo
Santos e pecadores iniciantes amadores
Manchas de batom e jantar em frente aos televisores
Bares enfumaçados, carros novos comprados
Em acapulco, férias, na tevê pilhérias
Eles só vivem pela vênus do varejo
(você sabe)
Eles só vivem pela vênus do varejo
Túmulos vazios e cabeças furadas
Sorrisos superficiais e camas esvaziadas
Melhor um quarto que não dê pra ver nada
E pegar um barco pra longe de tudo
Mamãe não vai gostar mas você devia
Viajar com o pessoal da rotina pesada
Ouça bem tudo que é dito
Só se preocupe se os cães não tiverem comido
(saca?)
Só se preocupe se os cães não tiverem comido
Porque se um vira-lata gane o bando todo vai ladrar
Sangue pros deuses custa menos que rezar
Garotos-soldado morrem à toa, mas Superman ainda voa
Dias de violência – loucura sem parar
Nunca vale a pena amar a vênus do varejo
(cai fora)
Não foda com a vênus do varejo
Tem uniformes novos no bazar da igreja
Todo fanático tem uma estrela que almeja
As ruas escuras retumbando com o som de homens marchando
Pela noiva do cartaz da promoção, marcha o orgulho da nação
Quem fornece tudo é a vênus do varejo
(se foder!)
Quem fornece tudo é a vênus do varejo
Constantine/lester/membrana mucosa – Muco Music © 1978
No site da Panini Tá esgotado e no Mercado Livre estão vendendo por R$ 160,00!! Espero que seja relançada… 😦
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Foi mega relançada com papel de qualidade superior, você viu?
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Obra-prima, OBRA-PRIMA!
Bom saber que está sendo relançado, eu apenas havia lido essa fase inicial de Hellblazer em scans. Vou adquirir a qualquer custo, nem que eu tenha que vender a minha alma!
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Essa edição não tão recente mas ainda é possível adquirir em sites especializados ou direto com a Panini Books…Vale muito à pena!
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E direto com a Panini a entrega é segura?
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Sim, acredito que sim!
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